sexta-feira, março 31, 2006

Est cupiditati et ipsa tarda celeritas

"Est cupiditati et ipsa tarda celeritas"
(Para o desejo até a verdade é lenta)


Preciso de me sentir cabra. Ela ligou. Vou despi-la a pensar que me estás a despir. Vou toca-la a pensar que me estás a tocar. Vou deixa-la tocar-me com as tuas mãos. Sentir a febre para ver se ainda sinto o sangue a latejar. Fingir um orgasmo que sempre fingi. Olha-la e ver que não és tu. Não interessa, nem importa. A cabra aqui agradece.

Lisbon Revisited

Os meus olhos são velhos. Nasceram antes dos dias em que vivemos. Antes até dos dias que estivemos juntas. Os meus olhos são de afogar os teus. Grandes demais para o teu rosto. Demasiado grandes para que possa algum dia encará-los. Eu sou estações de comboios, tu és uma coisa em fuga. Eu gosto de ver chegar e partir. Eu gosto tanto de partir... Tu és toda viagens. Meus continentes, minha maconha.

O que fizeste hoje não foi bonito...

Uma palavra para fragilidade?
Outra para abuso de confiança?
No fundo é sempre mais fácil falar dos outros.
Outra palavra para respeito?
Começo a ficar cansada de te explicar!
Uma última palavra para fugir... e fico com tempo para pensar em mim!

quinta-feira, março 30, 2006

As traseiras das nossas casas

Não remexas no meu passado,
Lembra-te que estou aqui
Numa estrela a pulsar de luz.
Galaxia inconstante de poeira que se desfaz

Tenho um nervoso miudinho que me faz avançar e me torna clarividente de coração magoado. Todo este lamento de quem quer algo mais do que esta vida mexida num movimento parado do quotidiano e rotina, quando no jardim lá fora, há vozes que nos chamam para uma brincadeira de gente grande e não é como é cá dentro de nós, que fingimos até doer o lado negro da lua... implantado num crepúsculo de que não nos libertamos porque os homens ainda não descobriram que a vida é bela. É nesta mistura sebastiana que me deixará roxa de raiva porque sinto sempre que os momentos me passaram entre as mãos e eu, sim, eu não agarrei nada.

Olho á minha volta e fico espantada.

E eis que lá vens tu. Não sei se sabes ,mas pessoas como tu não pisam formigas, caminham sim ao seu lado. Estás ca por mim. Estou cá por ti... Trouxe-te de herança que nos olhos quando me vim embora daí. E quando as vezes me dizem que tenho um olhar translúcido, que me traí a cada momento, sinto que não consigo fazer mais nada que sorrir, por exemplo...para o senhor que me vende as castanhas assadas e me diz que o Verão vai voltar. Mesmo assim ainda cá estás...e lá estás a olhar por mim com um olhar interessado, e eu perplexa. Raios! e logo agora que derrepente eu começava a achar que já ninguém tinha importância, surges tu com aquelas letras enigmáticas. Fazes-me perder a vontade de ir embora...é que acabaram-se as castanhas.

Agora a sério... Vila Viçosa ...

Sabem que me escondo na Belleville
Ninguém comparece ao meu rendez-vous
Os meus amigos enterrados no jardim
E agora mais ninguém confia em mim...
Era só p'ra brincar ao cinema negro
E os corpos no lago
Eram de gente no desemprego...
O que sinto em relação a ti não é bem medo. É assim, mais para o pavor...Posso dizer que nunca te pertenci deveras. No entanto, deixas-me o coração a nu. Não gosto disso. Há lugares pouco habitáveis, no meu coração. gostaria que permanecessem assim. Não é uma questão de teres ou não o direito. É assim e pronto. Não posso acusar-te de existires em mim. Lês para além do que está escrito; o que vêm em rodapé, o que não se deveria ler. É assim que o fazes. Por isso, a tua presença constrange tanto. Por isso fujo mesmo quando te procuro. Nada disto é para nós novo. Nunca te toquei deveras. Ou tu a mim. Contudo, já o disse, deixas-me o coração a nu. E eu não gosto. Também já o disse. O nosso destino é existirmos perpetuamente à procura uma a outra nos corpos de outras pessoas.

Pensão Beira-Minho- Santa Apolónia

A tua saliva é o alimento da minha fantasia. Esperaria horas por ti se me olhasses naquela dimensão que só tu me vês. Saí do corpo umas horas, que souberam a segundos, porque o tempo contigo é rápido e carente... E fui passear naquela estação que ainda me assalta os sonhos do que nos sobrou da adolescência. Fiquei naquela estação de onde nunca vais sair, e de onde o teu comboio não parte porque não há quem o queira ver partir, nem gente com vontade de te acenar de lenço em punho.Não foste, nem vais. Tens um dom mágico de me querer fazer ficar. Ali. Mas tu não perdes um passo por mim...ah pois é... e então?
Talvez te devesse fazer sofrer mais. Sem dúvida ou sem desculpa. Devia-te ter feito sofrer mais.

Madalena sem M

Sou uma Madalena arrependida, que não está interessada em trocar sal de lágrimas contigo. Não te odeio.Não me és indiferente. És-me igual.
Ps:Isto não é um lamento é um desbafo.

terça-feira, março 28, 2006

Na Cova Gala é só índios

Como de costume, chega e instala-se na minha vida. Uma mania que sempre teve, de se fazer chegar devagar e, sem que me aperceba, está à minha beira. Trocam-se as banalidades do hábito "Pois é, há tantos anos" "tás igualzinha", e tal. Perguntam-se coisas e parece que é a brincar mas ela nunca brinca. "então e tens-me sido fiel", "desde há dez anos que não tenho olhos para mais ninguém" e risos. Dá-me espaço, sufoco com pouco... Quando me pediu um beijo, tive de lhe dizer que não. Já não reconheço a tua boca. Tinhamos que começar tudo de novo, pelo princípio. "E isso ficou onde?". Pois não sei. Sabes que nunca fui grande coisa a dar direcções, até já nos chateamos por causa disso, lembraste? Foi há muito tempo...

A Crueldade e os Bolos com Creme

A hora mudou, já apetece mais passear pela marginal da praia ao final do dia. Daqui a nada está aí o Verão... de um lado para o outro da avenida, em fatos de treino de mais ou menos bom gosto, correm dezenas de pessoas com as t-shirts ensopadas de suor. A ver se se perdem uns quilitos antes da "saison". Cinco e meia da tarde e fiz uma maldade muito grande. Sentei-me a ver o mar na avenida e desembrulhei o maior bolo com creme que havia na montra da pastelaria. E eu bem vi, pelos olhares das pessoas que essas coisas não se fazem!...

segunda-feira, março 27, 2006

"As palavras nunca exprimem a verdadeira natureza das coisas", no entanto exprimem essa natureza do ponto de vista de quem as profere, são, por assim dizer, a expressão exacta do verdadeiro sentido das coisas em contexto causal.

domingo, março 26, 2006

- A sua guerra e a minha são diferentes -
disse Silampa acendendo um cigarro.
- Eu sei, mas a minha pode ser ganha.
- Ganhar nem sempre é o que importa.
Santigo Gamboa
in Perder é uma questão de método

domingo, março 19, 2006

Cabala/"Mal de Vivre"

Desmesurados sentimentos de inércia como vagas incompatíveis com o meu peito fraco. Apetecem-me febres intensas que me validem a vontade de prostração mais do que todas as razões que possa apresentar à minha alma e nenhuma ser cabal.
Vozes do meu passado... inconsciência severa que me tornava a dolência primaveril e de algum modo fértil.
É inconcebível que o vento não morda as mãos e me não derrube os membros. É impensável qua a vergonha de estar vivo não nos encha os dias de loucura.
A tragédia é vivermos. A única tragédia é essa.
Cabe cumprir cada uma das horas com precisão aritmética e sem justiça nenhuma.
A mim o mistério das cúpulas das catedrais não ser outro senão o meu desejo de que haja um mistério.
A mim a fome do infinito e a miséria do infinito.
Florestas de ramagens altíssimas por onde não entra a luz e por onde não entra nada.
Animais fulvos das florestas inventadas que me povoam o coração mais do que tudo.
Por cima de quantos mundos, unicamente o mar. Mar perfeito, mar sombrio. A insensatez do sal e a brancura da espuma.
A luz sadia de uma manhã em que nada aconteça espalhando-se cabalista sobre o Inverno da minha vida.

Uma ordem

Pára. As mãos. O gesto. O mundo. Principalmente o mundo. Apaga as minhas dores e encerra de uma vez todos os lugares onde eu não estive.
Eu não quero as tuas mãos quando mas apresentas assim, tão sujas de outras pessoas.
Eu não quero as tuas mãos assim tão repletas da falta das minhas.

Um mau número

Uma pessoa traz a sua vida como se fora uma conquista tímida. Que se leva a jantar fora ao restaurantezinho do hábito. Onde a dona já nos conhece de lá comermos todos os dias. De sermos discretos e quase silenciosos, numa humildade de sapatos velhos. Onde janta sempre o mesmo senhor na mesa do canto, e onde vão as empregaditas do comércio, que são sempre caras novas.
Então repara-se - que é de ter companhia - quer a luz é muito fraca, que a comida é uma monotonia oleosa e que as paredes estão sujas de fumo.
Pede-se desculpa, por não termos sido capazes de raparar nisso antes. Por se ter assim perdido os dias. E a nossa vida, que convidámos nessa noite para o meio de tudo isso, sorri, ainda sentada. Mas já nos disse adeus.

O tempo

O tempo… já passou!

O tempo… está para vir!

O tempo hoje não existe!

Deve ser por isso que muita gente esquece-se de o viver… porque ele hoje não existe! Já passou! Está para acontecer!

Quem és tu que me fazes pensar no tempo? Quem és tu que também pensas no tempo?

Quem és tu que me fazes perder a noção do tempo? Mas fazes com que o viva!

Fujo por me fazeres viver! Viver o tempo! Sentir o tempo!

Sinto-me no teu tempo, mas estou noutro tempo! Espaços paralelos, mas que se tocam… só durante uns segundos! Dá para saborear! E quando percebo o sabor a guilhotina cai, a guilhotina que eu comando mesmo não querendo… porque tu, tu estás disponível!

Decidir, escolher? São só interrogações com resposta óbvia! E eu fujo desta resposta… tenho medo de arriscar… medo de viver, medo de sentir! E a guilhotina cai…

quinta-feira, março 16, 2006

Shhhhhh!...

Nem todas as coisas são para serem ditas e por isso sabe melhor o silêncio. É uma planura que se justifica a si mesma. Com toda a desenvoltura.
As palavras chocam mais. Nem sempre correspondem ao que entendemos dizer e ultrajam assim a passagem curta e serena dos dias.
O horizonte é onde não estamos.
Sangue velho e cidades em ruínas - nunca chegamos a acontecer.

medo de sofrer \ medo de crescer \ medo de ser feliz

Mais uma vez a dor adormeceu… mais uma vez vendi-me… como tantas outras vezes…! Falo disto já livre da tristeza, é este o resultado da venda! É sempre assim, não consigo fugir. Não tenho força! Parece que prefiro este sorriso cego e seco, no sentido de que nada de novo vai daqui sair! É apenas não estar mal e ás vezes exageradamente sorridente, porque ansiosa, porque nunca verdadeiramente bem! Parece que é isto que consigo, em vez de pelo menos tentar o caminho que eu sei que me levará à verdadeira evolução, mas o que consigo seguir é o menos difícil!

Ser Pessoa é arriscar, então o que somos nós humanos? Que nos resignamos ao mais simples que podemos ser, ao mais fácil que podemos escolher, que tememos só de pensar no que podemos vir a ser, no esforço e escolhas que teríamos que tomar…! No que teríamos que crescer… e é tão difícil crescer…

quarta-feira, março 15, 2006

Iniciação

Há uma musa deitada num campo de lírios, e é de noite e treme de frio.
Há uma musa deitada num campo de lírios e a noite inicial vestiu-a de negro.
Há uma musa morta num campo de lírios e por isso a própria noite tem frio.
Há beleza no seu corpo para sempre estendido num campo de lírios.
E o temor que inspira fará rezar as solteironas e encher de pavor os animais da floresta.
E o temor que inspira fará cantar aos poetas canções de amor impossível.

Os fracassados

O olhar de um derrotado esconde por vezes maiores mistérios, cicatrizes mais gloriosas, feridas mais abertas do que todos os mártires.
Encandeiam-nos a vista, estas aparições ferozes, revolvidas na lama e no medo.
O andar abismal dos derrotados!
As triunfantes mãos inúteis dos derrotados!
Fabulosos hinos à miséria e ao futuro!...

As minhas mãos são azuis

As minhas mãos são azuis e progressivas. São manchas de cor na paisagem. Ou pelo menos é assim que eu as imagino, azuis e dementes. De uma demência azul, de uma urgência azul. A correr, abertas em voo e à frente dos meus braços.

A culpa é tua

Cometeste um pecado imperdoável: existias já e antes de eu ter dado por isso. Faz-me um jeitinho muito grande: morre e ressuscita.

terça-feira, março 14, 2006

STOP!

Há mesmo um grupo de pessoas que, constantemente, antecipam aquilo que julgam que os outros querem ouvir.
Durante grande parte das suas vidas os outros grupos de pessoas acreditam no que ouvem, aquilo que os outros julgam que eles querem ouvir. Condena-se assim vários grupos de pessoas a viverem na dependência do que julgam que é.
A felicidade e o sonho tornado realidade a todo o momento desenvolvem uma segurança desconhecida até então, provocando um evitamento de sinais que a possam meter em causa.
Este evitamento nasce da certeza da nova dependência e do novo conceito de segurança.
Esta dependência de segurança vai abafando a dúvida que emerge a medo de a poder sentir; descontrolo sentido como dor no vazio, ansiedade de satisfação imediata e angústia que chega a dar prazer , que vicia, envergonha e irrita; culpa por acreditar naquilo que julga querer ouvir. A fantasia por querer puxar e exceder os limites da recém-segurança é alimentada a dois. Alimenta-se do que se julga que é ( crença dos outros grupos de pessoas) e do que ainda não é (primeiro grupo de pessoas). Entenda-se "ainda não é" como o desejo de vir a atingir alguma coisa com a "ajuda" daqueles que julgam saber o que é melhor para eles os dois.
Esta dependência cresce no momento em que já foram derrubadas as referências para poderem acreditarem no que desejam para elas, se aquilo que as sempre manteve vivas e relacionais na sua história pessoal, ou aquilo que um grupo de pessoas, somente por intuir ( projectando-se assim) o que o Outro precisa de pensar para se realizar a ele próprio, proporciona.

segunda-feira, março 13, 2006

Definição de Grande Chato:

Pessoa (amiba) que vive para consumir o oxigénio produzido pela fotossíntese das plantas o qual seria muito melhor aproveitado por qualquer outro organismo vivo (por exemplo uma amiba).

Gravitar

O mundo é, efectivamente, um lugar fabuloso onde eu não me lembro de ter estado.

Seco

Cheira a seco. Tenho os braços doídos de sol. Ontem passei a tarde com os pés enterrados na areia da praia a falar de pieguisses com uma menina: "se eu ganhasse o totoloto fazia assim...".
O mar é tamanho e a areia vibra de luz, farta de branco que é a cor dos dias quentes; a desfazer os coágulos de Inverno que nos entopem as artérias. É bom acordar sem ter frio.É bom saber que nem tudo está na mesma - já faz sol. Que saudades eu tinha...
Se torna a chover emigro. Palavra que faço as malas e me ponho a andar. Palavra...
Reorganização sincrética. Oh meu deus! Será que foi meramente a isto que eu cheguei?...

domingo, março 12, 2006

Beleza Fria\Mor

Beleza Fria…! Porque é que em vez de utilizarmos o termo –Mórbido, não utilizamos –Beleza Fria? Fez-me sentido! Consigo olhar e admirar, admito, uma beleza fria, mas nunca despida da sua beleza! Contemplo e interesso-me! Não vale a pena colarmo-nos ás partes mais sombrias, menos aceites, porque assim perdemos a oportunidade de ver o todo e entende-lo para nós… Perguntem-se quantas vezes deixaram escapar experiência\conhecimento por entre os dedos por não se darem ao trabalho de verem para além de! Não têm que gostar, mas não se fiquem por olhar, vejam!

vermelho e preto



Se eu escrevesse aqui escrevia a vermelho… vermelho e preto ficaria não apenas bem, mas lindo! A minha vida pinta-se com estas duas cores, ás vezes tem mais, mas as outras estão adentro desta relação –vermelho e preto!

Opostos, odeiam-se mas beijam-se com vontade, com desejo! É daquelas paixões platónicas, puras mas negras, místicas mas embebidas em vermelho!

Será que se nota que tenho um olho preto e outro vermelho? Será que a fibra que envolve estas cores é transparente? Será que são cores só minhas?

São estas cores que me levam a chorar e a rir, são estas cores que ás vezes odeio com tanta intensidade, mas são elas que são minhas. As minhas cores! E… gosto delas, não há mais nada para além delas, são elas que me circunscrevem, porque são elas que me fazem sentir!

Ás vezes vão aparecendo gradualmente manchas desunidas e mais longínquas, que eu vou unindo até formar uma maior, maior, até que esta contagia e é contagiada pela mancha – mãe e é assim que o meu mundo de cores vai crescendo…

sábado, março 11, 2006

Hasta luego Comandante

Nem sempre a minha alma obedece à disciplina espartana que lhe imponho.
Raios me partam mais à minha incapacidade para pedir ajuda (a lembrar o título de um conto de Bukoswsky: "Tu mais a tua cerveja mais a tua mania de que és o maior").
Às vezes custa muito. Por mais paliativos com que tente enganar a sorte, ontem dei por mim a chorar sem motivo aparente. Sem soluços, sem ruído, "água e cloreto de sódio".
Talvez seja a raíz do Inverno já demasiado funda.
Falta-me falta sentir o meu cheiro nos lugares que habito e convivo com uma solidão que às vezes é uma conquista e outras uma imposição. Só que às vezes me custa muito, este silêncio monástico que me acompanha os gestos. Ontem dei por mim a chorar sem causa aparente.
A força também é isto, consentir que os ombros cambem, num "hasta luego comandante".

sexta-feira, março 10, 2006

Às vezes custa muito.

Digam-me que isto não é verdade ou então arranjem-me alguém em quem eu possa bater.

Abram imediatamente a porta da biblioteca que o senhor secretário de estado da juventude quer mandar um lacaio medir aquela merda aos passos...

O elo perdido

Aqui há uns vinte anos, era teoria nos meios antropológicos que a passagem do Homem de Neanderthal para o Homem de Cromagnon se deu apenas na Europa do Norte, sendo que o Homem de Neanderthal, menos evoluído, se tinha fixado na Península Ibérica. Hoje os espanhóis rebatem essa teoria. Os portugueses não.
Um general romano destacado para a Lusitânia, escreveu numa carta ao Cônsul em Roma que dizia que: "Esta gente não se governa nem se deixa governar".
Desde a proto-história até à idade presente as mudanças são bem poucas e vivemos na mesma letargia.
Se a Solução Final da Alemanha nazi tivesse acontecido em Portugal, quais seis milhões quais carapuça! Não tinha morrido um único judeu e ainda hoje andávamos a nomear comissões para a construção de fornos...
E a coisa continua a seguir no seu habitual remanso, o Presidente eleito é uma figura salazarista, um pai da pátria que também não há-de esquentar nem arrefentar muito.
A queda dos regimes comunistas da União Soviética mostrou que o regime proletário não funciona. Ora o Ocidente deixou de temer que o bicho pegasse por estas bandas e nos dias que correm o capital anda à solta. Faz falta uma ruptura. A humanidadde não evolui lineramente mas por altos e baixos, por fissuras. Contudo, o sentimento de classe já quase não existe (já quase não existem sentimentos e pronto), e o estado capitalista fez as coisas bem feitas: enquanto houver alguma coisa a perder ninguém se mexe muito. Já os estadistas da Antiguidade a sabiam toda: pão, vinho e circo e a malta vai andando. Pão, futebol e a irmã Lúcia e é mais ou menos a mesma coisa. É esta a ditosa pátria de Camões...

Será hoje?

Vou despedir o meu patrão!
Hoje ou amanhã?

Tarda, mas não falha!

quinta-feira, março 09, 2006

Pois nossas madres van a San Simeon
De Val de Prados Candeas queimar
Queimem candeas por nós e por si
E nós, velidas, bailaremos y...
(Do Cancioneiro Medieval Galaico-Português)
Preparo-me para ir à Senhora da Boa Viagem. Queimar candeias. Não tenho fé na religião mas tenho fé na santinha da Serra, no seu nicho pequeno. Gosto das flores e das velas que a rodeiam. Gosto da fé popular que lhe é cândida. Gosto dos meus amigos que gostam de ir à serra rezar-lhe. Há-de fazer muito vento, há-de estar frio. Por vezes custa a acender o isqueiro. Hei-de ir tomar café ao senhor Ernesto. Hei-de sentir-me em paz como sempre acontece, quando visito a serra à noitinha, no promontório onde mora a imagem.

Lárerái larerái…

Lárerái larerái… como queria que tudo fosse uma música… uma música onde o prazer emergisse tanto desse lado todo eufórico, como desse lado todo sadness… Lembrei-me desse título que me ficou “melancholy and the infinitive sadness” ás vezes é tanto assim… é só assim!

Sinto-me a fugir e a procurar, num ciclo que só se fecha com uma nova repetição, ou seja, se olharmos bem percebemos que nunca se fecha… sempre o mesmo!

Sinto-me a quase não querer sair, a quase precisar… Mas quem precisa disto?

Ah! É a tal auto – suficiência… reconheço, ás vezes chego-me a mim própria completamente, ter outra pessoa ao meu lado seria aguentá-la!

Sou mesmo esquisita, quero tanto… tantas coisas e ao mesmo tempo… não as conseguir alcançar… como hei-de eu verbalizar isto? Parece que o ser triste desperta em mim partes lindas, faz-me pensar, e saio daquela felicidade cega, despida do medo de pensar; torno-me eu!

Percebem estes antagonismos… o prazer que consigo tocar por estar triste, por me sentir diferente daquela que foge do pensar. O prazer de pensar!

quarta-feira, março 08, 2006

Percorri hoje largamente e a pé, todo o comprimento da minha cidade e só vi de cara alegre os cães vadios. Esses e dois sapos, gordos e enormes que deram para reaparecer triunfalmente nos jardins perto de minha casa.
Irra, que já irrita ver tanto mundo de cara amarrada!
Devo agradecer aos sapos - e eles a mim porque, não sei porque intuição divina, não os pisei. Sem óculos não vejo grande coisa. Como o mundo também não se me apresentou lá grande espingarda, optei por tirá-los por volta do meio dia... Tenho cá em mim que não perdi nada de especial.

segunda-feira, março 06, 2006

Um nome

Dividia-se vagamente entre razão e presságios. Existia veloz no intervalo dos dias, no momento que medeia entre uma coisa existir e deixar de o fazer. Tinha passos que eram passos decididos por vielas e mareava o mundo com instrumentos antigos. As suas viagens eram apocalípticas. Chamei-a sempre pelo meu nome.

Para que não existam enganos

Convém referir que tenho muitos defeitos: arrasto os pés; mordo os lábios, rio-me com demasiada facilidade e estargo os bolsos todos das calças porque ainda não se fabricam calças com bolsos suficientemente fundos para que neles me possa caber a totalidade das mãos. A quem interessar, que fique desde já assente. Penso, perco muito tempo na inércia de pensar, a formar pensamentos que são espirais de fumo: falsamente voláteis. O que eu gostava mesmo era que não fosse assim: que as minhas mãos não tivessem tanta necessidade de caber nos bolsos das calças, que não arrastasse tanto os pés ou que calçasse um número mais pequeno de sapatos (o que já seria alguma coisa). Que não procurasse tantas respostas para as perguntas que me esqueci de fazer. Que me não ausentasse tanto. A ausência é um estado de alma que amolenta e dói. Bastaria ser feliz por nada, era quanto bastava.

domingo, março 05, 2006

Confusão... Perdida....

nossoautista

Tanta coisa a fervilhar… tanta coisa a querer sair… mas não há como! Não está ao meu alcance! Desistir? Arrumar por mais uns tempos? Inchar? Arranjar outro estímulo que me entretenha e me faça sentir que esqueci? Fugir mais uma vez?
Decidir? Decidir o quê? É como se todas as opções se tivessem tornado nisto, num nada repleto de confusão! Quase neurótica, porque sei o que quero, mas não consigo! Mas tão distante disso por não ser verdade! O problema é que as verdades para mim são realmente efémeras, desvanecem com uma rapidez que eu dou conta, mas tento não ver para não me confundir ainda mais… é horrível! São como estilhaços de espelho que há muito se perderam na pequenez do meu imenso mundo, então o reflexo de quem sou nunca se chega realmente a juntar… um dinamismo caótico que acaba por mostrar sempre o mesmo! Sempre o mesmo… os mesmos sentimentos… sempre o eu como tema contagiante por não ter chegado a entender nada!

sábado, março 04, 2006

Para que se saiba, nunca te tocaram outras mãos que não fossem as minhas.
Morte que mataste Lira, mata-me a mim que sou teu
Mata-me com os mesmos ferros
Com que a Lira morreu...

sexta-feira, março 03, 2006

Há dias...

... em que me sinto tão cansada da vida,
mas se penso na morte, como solução, ainda fico mais cansada...

Vou é ter que parar de ter tanta pena de mim!

quarta-feira, março 01, 2006

Nem sequer estava muita gente no café, na verdade, eram umas cinco pessoas. Daí que eu sinta uma certa dificuldade em explicar o facto de ter ficado quase dez minutos à espera de pedir um café. A menina que comandava os nossos destinos e que decidia quem e a que horas iria tomar a bica, tinha perfeita consciência da minha presença: os nossos olhares cruzaram-se indistintamente umas quantas vezes. Contudo, a organização das chávenas e dos pires segundo um esquema mental para mim impossível de enquadrar dentro de um padrão minimamente lógico, parecia-lhe mil vezes (dez mil vezes) mais importante, ocupando todo o seu pensamento autista (ele há autistas onde menos se espera...). Quando por fim se dignou a pousar o paninho húmido, olhou-me com um profundo suspiro. Palavras tais como "o que deseja?" - simples, mas bonitas - ficaram-lhe presas algures no peito.
"Era um café e um copinho de água. Se não for muita maçada..."
Olhou-me com um fastio mal reprimido. Eu segurei-lhe bem o olhar pensando com muita força: "Gran-de va-ca!".
Sílaba por sílaba e para não haver enganos.
Existem pensamentos que o nosso olhar verbaliza.
Posso afirmar que ela não mugiu só porque estava para me contrariar.
Piropos como "porca, parva, badalhoca e balzaquiana", ficam para a próxima vez que nos encontrarmos.

Último golpe

Último golpe é a frase que se ouve a seguir a soar o gongo e que anuncia a última hipótese de fazer apostas numa mesa de jogo tradicional dos casinos, na gíria, o pano verde.
O jogo tradicional obecede a uma elegância circense, com os pagadores de banca direitos e impecavelmente vestidos, posicionados por trás dos parceiros ao toque das horas, na roleta e ao toque das meias horas, no dado. Esperando pacientemente a sua vez de ocuparem lugares à bola e a pagar jogo. Nos corredores do casino que não estão disponíveis ao público, respira-se um ambiente teatral: pagadores com as gravatas desapertadas juntam-se às cozinheiras e às bailarinas cubanas num élan de plumas e cheiro a fritos, sentados em grades de cerveja vazias. Fumam-se muitos cigarros.
O senhor Mendanha é pagador de jogo. Tem um ar de extrema elegância, que comprova um dia ter existido nobreza de sangue em Portugal e uma voz contida e apocalíptica. Os pagadores, reunidos pelos corredores, assemelham-se a um convénio da costureirinhas, com os seus diz que disse e "viste aquela tipa". O senhor Mendanha fuma interminavelmente. Ficavamos sempre os dois, camisas desapertadas e cigarros acesos antes do chefe de sala afixar os pagadores da hora seguinte.
O senhor Mendanha é brazonado, interessa-se por hieráldica e por muitas outras coisas.
"Sabe minha boa amiga, não pude realmente ir ao jantar do clube monárquico". E explicou:
"Imagine que jantava com os meus pares e passava um agradável serão. Imagine ainda que mais tarde essas pessoas vinham jogar ao casino. A minha amiga bem sabe que aqui lidamos com gente de toda a espécie, que temos de digerir muita coisa, mas, que um dos senhores com quem eu tivesse jantado me oferecesse uma grojeta, isso, eu não saberia digerir". Está explicada a nobreza do senhor Mendanha.
Encontrei-o hoje, sempre efusivo e de gestos clássicos. Estendeu-me a mão e as suas recomendações sentidas.
Lembrei-me dos serões nos corredores do casino.